(Sístole & Diástole) ou (Atrás dos olhos das meninas sérias)

Mais importante que a palavra é a textura - até mesmo porque a palavra (quase) nunca presta.

domingo, julho 30, 2006

outra diferença vetorial.

ninguém sabe. ninguém sabe mesmo disso. do cadáver insepulto [expressão gentilmente roubada de um cadáver sepultado] que sem futuro, crava os olhos nas costas e de volta para o passado deseja fazer dele o eterno : o tempo parado, imobilizado. futuro aniquilado; passado presentificado; e o presente mesmo, deslocado lá pr'um canto escuro, já que cadáveres não vivem [e viver é por definição, viver o tempo presente]. inversão do tempo como aquele dado pela nostalgia, como a mulher que vestida de azul, trazendo temperos e dois girassóis do mercado central, se senta no ônibus num daqueles bancos, que virados no sentido contrário, andando de costas, não a deixam ver para onde vai, a próxima estação, mas só a paisagem deixada pra trás, abandonada, que se distancia e cede o foco dos olhos pra um passado-paisagem mais imediato, que por sua vez dá lugar a um passado ainda mais imediato e por sua vez deixa entrar um passado fresco saído-do-forno, que por sua vez perde a vez; um acúmulo de imagens se distanciando em graus, o presente indecentemente tornando-se passado, fugidio sem cessar, sem disfarce - diante de seus olhos bem abertos, feito o girassol plantado no seu colo. ela não vê pra onde vai, mas só o que sendo, já não é mais, ela só olha para o que já foi. e como se perdesse aquilo que mal sabia ter ganho, como se o agora fosse só perda - como se só escapasse -ela sente a vertigem da violência do tempo que lhe entrega e arranca dos seus braços, no mesmo instante, uma coisa que nem consegue ver qual é, de tão rápido. ela só se sente plena naquele passado que congelado na memória, ninguém!, nem mesmo o tempo que corre bradando lá fora, pode lhe arrancar; e somente na memória consegue ver com nitidez esse pacote que lhe foi entregue e arrancado quase simultaneamente [ou de um quase nada sucessivo]. a memória do passado é seu eterno. a morada do eterno é a sua memória, a memória da moça.
nos bancos normais, andando de frente, vislumbra-se o destino, o próximo ponto, vendo a rua que se deve entrar, o sinal lá na frente fechado, o carro que corta o ônibus e o porquê da buzina escandalosa que assusta os desavisados, sempre perdidos em algum lugar lá fora ou lá dentro. nesse banco onde se senta um menino qualquer trazendo no colo uma pasta qualquer, ele vê de antemão o futuro e [chegando.o.o.o.o.] o tem tornando-se presente, e [chegando.o.o.o.o.o.] o tem tornando-se presente, e [chegando.o.o.o.o.] o tem tornando-se presente, sem tempo para o passado que vai sendo deixado atrás das rodas; mesmo com algum desvio no trajeto e mesmo que do futuro se engane - obras.homens trabalhando.ambulância.um morto e dois feridos.engarrafamentos.buracos.quebra-molas - ele aponta os olhos pra lá, e vê que o presente fugidio ganhará alguma coisa [coisa já pré-vista] futura que ocupará o seu lugar, e mais outra, e mais outra. a sensação de que algo sempre está por vir. à frente dos olhos a potência, e nos próprios olhos o ato, é o menino olhando. atrás dos olhos o menino não se detém, ele só olha pra fora, adiante.

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

O presente é diferente dos outros tempos. Ele sucede a si mesmo, continuamente.

3:49 PM  

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